Faz uns dois anos, passei uma semana na Alemanha, a trabalho. Achei umas anotações.
A primeira estranheza é a língua, claro. Na Europa ocidental temos português, espanhol, francês, inglês, italiano, que a gente fala ou se não fala arranha, sempre entende um pouco. O alemão é o que dá aquela estranheza braba mesmo, de ouvir as pessoas falando e não entender absolutamente nada. É sempre estranho imaginar que possa haver outras línguas, com palavras totalmente diferentes para as mesmas coisas. A gente ouve e pensa “nossa, que bárbaros, não sabem nem falar direito”. E os bárbaros originais — godos, visigodos, vândalos, que sei eu — eram mesmo os alemães da época.
Eu já conhecia a palavra ausgang, que é saída. Hoje descobri seu antônimo, eingang, entrada. De fato, “ein” lembra o inglês “in” e “aus” lembra o inglês “out”. Mas “gang” eu não sei o que é. Talvez tenha relação com o inglês “going”, com sentido de movimento. Poderia colocar no Google, mas prefiro especular.
Fiz uma parte da viagem de trem. Uma coisa notável é a quantidade de placas fotovoltaicas. Difícil uma casa que não tenha. E não estão só nos telhados, estão também no chão. Filas e mais filas e mais filas de placas azuis, competindo com o verde por um espaço para fazer seu tipo peculiar de fotossíntese.
Na noite de segunda eu saí para andar em torno do hotel, procurando onde jantar, e me perdi. Foi a primeira vez na vida que eu fiquei realmente, literalmente, perdido. Todas as ruas pareciam iguais. A sorveteria que ora estava à minha esquerda a outra altura passou à minha direita. Ainda bem que o centro histórico de Regensburg é muito charmoso, pelo menos a gente quando está perdido se distrai com a vista. Acabei entrando num restaurante com wifi, jantei, abri o waze no celular e encontrei o caminho para o hotel. Estava a uns duzentos metros. Infelizmente, era um Pizza Hut. Não é que a pizza seja ruim, só não é boa.
O pessoal da universidade organizou uma caminhada no campo, passando pelo rio Danúbio. Bonito, tinha até uns cisnes. Só achei meio puxado, saímos às 15:00 e voltamos às 19:00. Ainda por cima, choveu na nossa cabeça e caminhar com o tênis encharcado é meio complicado. Tudo somado e subtraído, programa de índio. Das indische Programm. Ao final, fomos todos jantar num restaurante curdo. Eu nem sabia que isso existia. “Mas, Marcel, como é a culinária curda?” Amigo, o cardápio estava em alemão. Até onde eu pude perceber, tem saladas com queijo feta, como os gregos, e os pratos costumam vir com uma espécie de cuzcuz e carne é sempre de carneiro.
Gosto de manter as interjeições brasileiras quando estou em outro país, só de farra. Em vez de “danke” ou “thanks”, mando um “valeu”. Todo mundo finge que entende. Eles aqui já estão acostumados a se despedir com “tchau”, então eu digo “falou”. Quando cruzo com alguém no corredor eu levanto a sobrancelha e mando: “opa!”
Descobri que não poderia embarcar de volta para o Brasil sem o resultado negativo de um teste de covid. Covid? Fazia tempo que não ouvia falar nisso. Detalhe: o teste custa 75 euros, que para os europeus talvez não seja grande coisa mas para mim é tipo uns 450 reais, hahahaha (rindo de nervoso).
Descobri que os aeroportos brasileiros adotaram o costume europeu de perguntar se o café é “curto” ou “longo”, que foram batizados de “pequeno” e “médio”. Só que o nosso café nunca foi pequeno, o “curto” europeu era metade do nosso tradicional. E agora o nosso “médio” é o dobro do “longo” europeu.
A moça do balcão viu que eu não sabia o que pedir. Explicou que o pequeno tem 45ml e o grande tem 90 ml. Eu continuava hesitando. Ela foi ainda mais solícita e ofereceu o seguinte esclarecimento: “o de 45 é menorzinho; já o de 90, é maiorzinho”.
Na fila para despachar a bagagem em Guarulhos. Uma placa avisa que a mala não deve ser colocada em pé na esteira, e sim deitada, com as rodinhas para cá. O sujeito na minha frente tem duas malas. Coloca a primeira em pé. O funcionário respira fundo e explica como tem que ser. O cara deita a mala, mas com as rodinhas pra lá. Nova explicação. A segunda mala ele coloca em pé de novo.
Trabalho em empresa multinacional. Também tenho a mania de me despedir de pessoas de outros países com um singelo, Valeu hein! Outras vezes, E aí cara! Beleza?